Sobre o blog:

“A humanização do nascimento não representa um retorno romântico ao passado, nem uma desvalorização da tecnologia. Em vez disso, oferece uma via ecológica e sustentável para o futuro” Ricardo H. Jones

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Partilho: desabafo de mãe

Deixo-vos as palavras da mãe AM - não deixem de espreitar o seu excelente blog http://www.meninadaagua.blogspot.com/

A minha verdade sobre a amamentação



Muita coisa se escreve sobre os benefícios da amamentação, sobre como é cómodo ter o leite quentinho e sempre disponível, sobre as vantagens para a saúde do bebé e da mãe…


Consultei fóruns, blogs, sites, SOS Amamentação, Mamar ao Peito, … Li os livros do Dr. Carlos Gonzalez, da Laura Gutman, do Michel Odent, … li os manuais de aleitamento da OMS, … Falei com a minha Doula, com outras Doulas, com Conselheiras em Amamentação. Aprendi muito, a todas e a todos o meu sincero agradecimento. Muito me ajudaram quando eu necessitei e muito contribuíram para o sucesso da amamentação. Na verdade, sem todo este apoio não teria sido capaz de amamentar.


Mas há uma coisa que ninguém fala e que é o motivo que justifica toda esta necessidade de apoio, é que amamentar é muito difícil. Amamenta um bebé não é o caminho mais fácil, é o caminho mais difícil! É necessário ter muita coragem, muita persistência, muita vontade de amamentar, pois caso contrário, a desistência é, certamente, o caminho mais fácil.


Não desejo assustar as futuras mamãs! Eu que sou acérrima defensora a amamentação! Eu que ultrapassei todas as dificuldades (subida de leite muito dolorosa, pensei que não tinha leite, que o meu leite não saciava o bebé,…) e ainda hoje continuo a amamentar! Claro que não quero assustar ninguém. Antes quero dizer, persistam, sigam o vosso coração, porque é possível!


Mas hoje apeteceu escrever sobre aquilo de que não se fala, mas que eu trago no coração e acho que poderá fazer eco nos corações de outras mães. Hoje quero escrever sobre as da da amamentação, principalmente aquelas que reflectem, de alguma forma, a minha própria experiência.


Na verdade, a amamentação deveria ser a coisa mais fácil do mundo! O leite deveria fluir naturalmente e facilmente da mãe para o filho ou filha associado a um acto de prazer e livre de ansiedades, angústias ou dores. Afinal somos mamíferos! Sim, mamíferos como os outros mamíferos que vivem na Natureza, como os elefantes, os leões, os tigres, os cães, os gatos, os ratos, as baleias, … E não vemos os bebés leões a chorar por as mães não terem leite suficiente. Somos mamíferos, porque temos mamas e mamamos.


Mas com o ser humano, na nossa sociedade ocidental moderna, a amamentação para existir tem que conseguir superar uma série de obstáculos.


Nos primeiros dias, após o parto, que normalmente não é um momento empoderador, há que passar pela angústia de não saber se o leite é suficiente, em quantidade e em qualidade, para alimentar um bebé que não pára de chorar ou que não aumenta as gramas desejadas na maternidade. Aumentar de peso nos primeiros dias é missão quase impossível, pois já está provado que nos primeiros dias os bebés perdem peso, mas ainda há quem tenha a ilusão da necessidade do bebé ganhar peso para abandonar a maternidade. E para o choro do bebé, a solução também costuma passar pela administração de suplemento.


Depois, por volta do terceiro dia, há que passar pela subida do leite. Situação esta, muitas vezes fisicamente dolorosa, à qual se junta a angústia provocada pelo bebé que não pára de chorar.


Se os mamilos gretarem ainda dói mais, e tenho ouvido relatos de mulheres que não conseguem ir para além desta dificuldade!


Mais uns dias e surge o refluxo que também é tratado como mais uma oportunidade para pôr fim à amamentação! Até agora tudo o que li amamentação justifica que esta é o melhor para o bebé e mesmo em caso de refluxo o leite materno é o mais aconselhado. No entanto, uma amiga diz que o pediatra lhe disse para parar de amamentar por causa do refluxo do filho, passando este a tomar leite anti-refluxo! Eu fiquei estupefacta com este relato!


Depois de passadas estas situações que ocorrem, em geral, nos primeiros dias, surge, por volta do 1 mês de vida do bebé uma alteração no leite materno, que passa de leite de transição a leite maduro. Muitas mulheres relatam que por volta do primeiro mês, ou mês e meio do bebé, deixaram de ter leite! Dizem que as mamas ficaram mais pequenas e já não têm leite para alimentar o filho ou filha. Se amamentaram até aqui, passando por algumas destas dificuldades e sem apoio é aqui que muitas vezes acabam por desistir desta árdua missão de amamentar o bebé.


Mas há mulheres que persistem e continuam a amamentar, seja por não sentirem muitas das dificuldades aqui descritas, seja porque tiveram algum apoio que lhes permitiu chegar um pouco mais longe na amamentação.


Eis que chega o momento de regressar ao trabalho! Este é também um momento crítico para a continuidade da amamentação. A questão do regresso ao trabalho, provoca uma alteração substancial na vida da mãe e do bebé, pois agora deixaram de ter a possibilidade de estar juntos todo o dia e de poder amamentar livremente (ou de 3 em 3 horas, no caso de mães que não amamentam a livre demanda), para estarem juntos apenas ao fim do dia e durante a noite. O tempo disponível para a amamentação fica muito restrito. A juntar a isso, a mãe passa a ter mais uma ocupação diária, além de cuidar da casa e da criança. Nesta situação, quando chega a noite a mãe em geral está cansada e deseja dormir, pelo que a amamentação nocturna, muitas vezes passa a ser mais um tormento do que um acto de prazer entre mãe e filho ou filha. Muitas das minhas amigas desistiram nesta fase, umas referem que deixaram de ter leite e outra dizem que os filhos se desinteressaram da mama tendo preferido o biberão! (Talvez no futuro passemos de mamíferos a biberoníferos!)


Mesmo continuando a amamentar e a trabalhar, o facto é que as crianças amamentadas acordam muitas vezes durante a noite. Os amamentados acordam, em geral, mais vezes do que bebés que bebem biberão. E uma mulher que passa o dia a trabalhar tem mesmo que dormir. Estar submetida, meses a fio, a duas ou três horas (quatro ou cinco, na melhor das hipóteses) de sono nocturnas é uma tortura. Dizer que ao dormir com o bebé pode amamentá-lo sem se incomodar muito é muito fácil, mas a realidade não é bem assim. De facto, dormir com o bebé ajuda muito, pois não é necessário a mãe levantar-se para amamentar, mas não resolve a falta de horas de sono da mãe. Eu pessoalmente, só às vezes é que consigo dormir enquanto a minha filha mama, e quanto mais cansada estou mais difícil é para mim amamentá-la e dormir. E não sou a única a referir esta dificuldade!


Por último, mas não menos importante, a adicionar a tudo junta-se a situação do companheiro. É que este também tem queixas e exigências, pois o bebé surgiu e ocupou toda a atenção da mãe. Enquanto o bebé está a mamar só há lugar para dois, mãe e filho, o que muitas vezes provoca o ciúme inconsciente do pai que acaba por, de certa forma ficar ressentido com a situação. Acredito que todos os pais fiquem orgulhosos com facto dos seus filhos serem amamentados, mas também acredito que, lá no fundo, se sinto postos de parte durante estes momentos. E quanto mais frequentes e intensos forem, mais os pais se sentem postos de parte!


Além de se sentirem postos de parte por causa do bebé, a mulher, em geral, já não tem o mesmo desejo sexual que tinha antes! Agora nunca lhe apetece, apesar de às vezes até se entregar, já não é com o mesmo entusiasmo. Este facto perturba muito a relação do casal e causa um sentimento de dualidade à mulher, que muitas vezes se sente dividida entre o companheiro e o bebé.


Depois de ter lido o livro do Dr. Michel Odent, percebi que esta alteração na sexualidade está justificada cientificamente e é desejável que seja assim. O acto de amamentar provoca a libertação de hormonas de prazer na corrente sanguínea da mãe e do bebé que mama, semelhante ao que acontece numa relação sexual entre dois parceiros. Neste sentido, o desejo sexual da mulher encontra-se, de certa forma preenchido com a relação com o bebé. Laura Gutman também refere este facto.


Ora, é obvio que tudo isto provoca muitas tensões no seio do casal, e tensões, stress, ansiedade, cansaço, … são tudo factores que inibem a produção de prolactina!


Acrescento ainda a questão social… Hoje, no nosso tempo, na nossa sociedade, a amamentação tornou-se num acto heróico, o qual é apreciado por uma minoria e desprezado pela maior parte das pessoas. Verifiquei que a partir de uma certa idade, a partir do primeiro um ano da criança, começa a ser visto como algo de estranho e até indesejável. Amamentar até aos dois anos é visto como algo de anormal fruto de ideias desviadas do socialmente aceitável. Uma amiga que não amamentou até me veio perguntar se não fará mal à minha filha mamar depois dos dois anos de idade! Estamos mesmo desviados do comportamento natural e saudável numa sociedade onde o biberão e o leite de vaca passam a ser a melhor coisa para a criança em detrimento do leite materno!


A quem não consegui amamentar, seja por que motivo for, sinto muito. Certamente foi a decisão possível nesse momento e fez o melhor que soube para si e para o bebé. Talvez não tivesse tido acesso a toda a informação disponível sobre o assunto, ou talvez não tivesse tido o apoio necessário. Porque, para amamentar, hoje, é preciso apoio e muito!


Para quem consegue lidar com tudo isto e outros factores inibidores não referidos aqui e continuar a amamentar até aos 2 (ou mais) anos da criança, os meus sinceros parabéns! A mulher que consegue este feito já é digna de uma medalha, pois certamente que percorreu uma longa e conturbada caminhada.


E a medalha está ganha! A medalha é dada pela saúde da mãe e o do filho, ou filha, é dada pelo vínculo que se estabelece entre os dois, pelo prazer de amamentar.


A amamentação dá-nos momentos únicos na vida, na vida de uma mulher e do seu filho, momentos que não podem ser vividos de outra forma nem percebidos por quem não tem acesso a eles. É uma maneira mágica de dizer ao nosso filho “Eu Amo-te! Ainda bem que existes na minha vida!”.


Sinto muito por quem não teve oportunidade sentir um dos maiores prazeres da vida!

2 comentários:

Margarida disse...

Estou muito grata por ter publicado no seu blog que tanto aprecio e me inspira.
Beijinho

PatríciaMesquita disse...

Por tudo aquilo que aqui foi dito e por esta frase:

"E a medalha está ganha! A medalha é dada pela saúde da mãe e o do filho, ou filha, é dada pelo vínculo que se estabelece entre os dois, pelo prazer de amamentar."


Eu assino por baixo... aos três anos e 8 meses da minha filha ter nascido... continuo a amamentá-las (algumas vozes ainda se levantam e perguntam: até quando... Até ela querer!)