"Em casos de parto difícil, um shaman (curandeiro) intervém a pedido
da parteira, e canta para fazer o bebê sair do corpo da parturiente. A
mulher está deitada na rede e o shaman está de cócoras por baixo dela.
A canção abre com uma descrição do problema com que a parteira se
defronta, do seu pedido ao shaman para a ajudar e da entrada deste em
cena. Continua com a descrição das coisas que fez na cabana da mulher
para preparar a canção-drama: fumigações com sementes de cacau
queimadas, orações e escultura de figuras sagradas em madeira. Toda a
canção representa uma procura, com a ajuda das figuras sagradas, de
Muu, o deus que criou o bebê. Muu habita na vagina e no útero ("a
voragem negra e profunda") da parturiente e a luta para arrancar a Muu
a essência vital da mulher - que o deus roubou -, de modo a que o bebê
possa nascer, tem lugar dentro do corpo da mãe. Cada órgão possui a
sua alma própria e a essência vital de cada pessoa consiste na
cooperação harmoniosa das diferentes almas do seu corpo.
O shaman invoca os espíritos das bebidas alcoólicas, dos ventos, das
águas e dos bosques, e mesmo os espíritos dos 'navios de prata do
homem branco'; descreve o corpo da mulher em termos que o relacionam
com toda a terra e com todas as forças da natureza. Depois relata com
os curandeiros estão a penetrar no seu corpo para combater Muu e como
iluminam o caminho. Descreve o seu percurso através do interior do
corpo, numa espécie de geografia emocional dos órgãos internos,
habitados por monstros e animais ferozes e emaranhado de fibras que
apertam o útero. Invoca então os senhores dos insetos dos bosques para
que venham cortar os fios. Segue-se um torneio, ganho pelo shaman e
por aqueles que o ajudam. Então ele tem que realizar sua difícil
descida com auxílio dos senhores dos animais que vivem em tocas.
Embora, o shaman e seus acólitos, ao entrarem no corpo da mulher,
tivessem de seguir em 'fila indiana', podem sair 'quatro ombro a
ombro'. O colo do útero está a dilatar bem.
Através do psicodrama do mito, o shaman dá à parturiente uma linguagem
metafórica na qual a sua rovação pode ser expressa e adquirir
significado. Trata-se de uma forma altamente elaborada de pscoterapia,
sendo este o único tratamento realizado."
(Sheila Kitzinger, Mães - um estudo antropológico da maternidade.
Lisboa, Presença, 1978; pp.89-90)
da parteira, e canta para fazer o bebê sair do corpo da parturiente. A
mulher está deitada na rede e o shaman está de cócoras por baixo dela.
A canção abre com uma descrição do problema com que a parteira se
defronta, do seu pedido ao shaman para a ajudar e da entrada deste em
cena. Continua com a descrição das coisas que fez na cabana da mulher
para preparar a canção-drama: fumigações com sementes de cacau
queimadas, orações e escultura de figuras sagradas em madeira. Toda a
canção representa uma procura, com a ajuda das figuras sagradas, de
Muu, o deus que criou o bebê. Muu habita na vagina e no útero ("a
voragem negra e profunda") da parturiente e a luta para arrancar a Muu
a essência vital da mulher - que o deus roubou -, de modo a que o bebê
possa nascer, tem lugar dentro do corpo da mãe. Cada órgão possui a
sua alma própria e a essência vital de cada pessoa consiste na
cooperação harmoniosa das diferentes almas do seu corpo.
O shaman invoca os espíritos das bebidas alcoólicas, dos ventos, das
águas e dos bosques, e mesmo os espíritos dos 'navios de prata do
homem branco'; descreve o corpo da mulher em termos que o relacionam
com toda a terra e com todas as forças da natureza. Depois relata com
os curandeiros estão a penetrar no seu corpo para combater Muu e como
iluminam o caminho. Descreve o seu percurso através do interior do
corpo, numa espécie de geografia emocional dos órgãos internos,
habitados por monstros e animais ferozes e emaranhado de fibras que
apertam o útero. Invoca então os senhores dos insetos dos bosques para
que venham cortar os fios. Segue-se um torneio, ganho pelo shaman e
por aqueles que o ajudam. Então ele tem que realizar sua difícil
descida com auxílio dos senhores dos animais que vivem em tocas.
Embora, o shaman e seus acólitos, ao entrarem no corpo da mulher,
tivessem de seguir em 'fila indiana', podem sair 'quatro ombro a
ombro'. O colo do útero está a dilatar bem.
Através do psicodrama do mito, o shaman dá à parturiente uma linguagem
metafórica na qual a sua rovação pode ser expressa e adquirir
significado. Trata-se de uma forma altamente elaborada de pscoterapia,
sendo este o único tratamento realizado."
(Sheila Kitzinger, Mães - um estudo antropológico da maternidade.
Lisboa, Presença, 1978; pp.89-90)
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