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“A humanização do nascimento não representa um retorno romântico ao passado, nem uma desvalorização da tecnologia. Em vez disso, oferece uma via ecológica e sustentável para o futuro” Ricardo H. Jones

quinta-feira, 29 de maio de 2008

É o coração dos pais que manda nos primeiros meses de vida dos bebés!

retirado do Jornal de Noticias

Bebés nas mãos do saber popular
alfredo cunha

Pais tendem a lavar e esterilizar os biberões, o que é considerado desnecessário pela comunidade científica

Domingos de Andrade

É o coração dos pais que manda nos primeiros meses de vida dos bebés. O coração, os avós, os amigos, os vizinhos, os media e, lá para o fim, os profissionais de saúde. Os dados constam de um inquérito feito em diversos hospitais e maternidades do país, que chegou a outras conclusões curiosas ninguém sabe ao certo quando dar água ao recém-nascido, que tipo de água e se há-de esterilizar ou não o biberão. Mas não há problema. Entre a comunidade científica é cada cabeça sua sentença.

Responderam 257 pais de recém-nascidos, em entrevistas individuais, a grande maioria dos quais jovens entre os 24 e os 34 anos. E a primeira dor de cabeça deveria ser a pergunta mais simples. Quando dar água ao bebé? Mais de 63% davam após o 28.º dia - muitos aos dois meses, outros aos quatro, aos seis, aos nove e até houve quem respondesse só após o primeiro ano. É o medo que justifica as respostas. O medo e o desconhecimento 9,4% não sabe sequer o que fazer.

Deixar o bom-senso falar

Os 31,5% de inquiridos que responderam dar água desde o nascimento fazem-no em situações de calor, ou então por razões várias, nomeadamente "quando o bebé tiver a boca seca". Se o atarantamento dos pais é visível nesta primeira pergunta do estudo, elaborado por finalistas do Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Lisboa (ler ficha técnica), o que pensam os especialistas não o é menos. Como constatam os autores, há trabalhos de investigação que aconselham a não dar, além do aleitamento materno, qualquer tipo de líquido ao recém-nascido, como há quem advogue o suplemento de água em situações particulares (febre, diarreia, calor) em que o bebé perde mais líquidos.

Em que ficamos, então? O pediatra Octávio Cunha, como o especialista em saúde pública Mário Cordeiro, que acompanhou o inquérito, olha para as respostas do estudo com serenidade. "Os pais devem proceder como lhes diz o coração. Eles são sensatos, são responsáveis pelos filhos em termos globais e depois são acompanhados pelo médico de família ou o pediatra. É tudo uma questão de bom senso, como dar água, ouvir mais os avós, ou mais os tios, ou não ouvir ninguém". Além de que, diz, "a criança sabe muito bem do que precisa. E se recusa água é porque não precisa".

Água, portanto, desde que o bebé nasce e se necessitar. E que água? Quase todos os pais (75,1%) optam pela mineral em detrimento da rede pública (23,3%). É aqui que a campainha do "errado" mais se faz ouvir. Os autores explicam a água da torneira tem, à luz da lei, controlos mais rigorosos do que a mineral e é mais barata. Sobram os argumentos ambientalistas - uma garrafa de plástico pode demorar cerca de 500 anos a degradar-se. Mas a moda é que manda, como explica o estudo. Em Portugal, o consumo de água engarrafada subiu 56% na última década e o marketing ajuda, criando "tipos" de água para todos os gostos, desde as com sabor, às específicas para lactentes.

Octávio Cunha também aqui não tem dúvidas. É um avô orgulhoso de dar água do cano aos netos, como já deu aos filhos. "As famílias não têm dinheiro para comprar leite, quanto mais água", ri, muito a sério, somando outros argumentos. "A maior revolução do século passado não foram os avanços tecnológicos, mas sim a instalação das redes públicas de água e saneamento, que permitiram baixar a mortalidade nos países ocidentais para os números de hoje. A instalação de água potável nas casas e as redes de saneamento tornaram-se nos factores mais relevantes para a diminuição das doenças infecto-contagiosas".

Esterilizar biberões

Os pais foram ainda inquiridos sobre a esterilização dos biberões versus apenas a lavagem, com 97,7% a admitir fazer as duas operações - o que é considerado pelos autores como desnecessário e de grande custo económico. Só para se ter uma ideia, e constatando que 49,8% dos pais compram esterilizador eléctrico a uma média de 100 euros cada (há uma média anual de 110 mil bebés), estamos a falar em gastos na ordem dos 4,5 milhões de euros, fora a água e a electricidade. A culpa, dizem os autores, é da deficiente informação 36,65% dos pais ouvem sobretudo os familiares e amigos; 19,8% dizem ter sido influenciados pelos media e por livros e só 19,5% acreditam nos profissionais de saúde.Ficha técnica: O estudo epidemiológico observacional foi realizado no passado mês de Abril, em cinco maternidades e hospitais a 257 pais de recém-nascidos. Ana Cruz, Ana Ferreira, Andreia Gonçalves, Ines Lucas, João Castro e Rui Fonseca foram os os autores, da Faculdade de Ciências Médicas, orientados pelo pediatra Mário Cordeiro.

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