Sobre o blog:

“A humanização do nascimento não representa um retorno romântico ao passado, nem uma desvalorização da tecnologia. Em vez disso, oferece uma via ecológica e sustentável para o futuro” Ricardo H. Jones

sábado, 24 de maio de 2008

Aguardo pelos vossos comentarios....

"Papá na sala de partos: desejo ou obrigação?

Há trinta anos, um pai que estivesse na sala de partos, junto da sua mulher, à espera que a cabecinha do bebé saísse, era um acto impensável.
Um claro exemplo é a típica imagem cinematográfica do homem a fumar ansiosamente, caminhando apreensivo, enquanto espera que se abra uma porta e apareça uma enfermeira vestida de branco, dizendo: "Parabéns, é um menino".
Naquela época, nenhum homem pensaria ser parte desse momento íntimo. O seu lugar era este: cá fora.
O parto era uma coisa de mulheres, e o único homem que tinha entrada era o obstetra.
Esta realidade foi mudando com o passar dos anos, e de facto hoje são poucos os pais que ficam de fora. Fora da sala de partos e, por fim fora da situação.
No entanto, estar presente no momento do parto não implica que se seja melhor pai ou marido.
Chegou o momento
O futuro papá chega ao momento do parto com um sentimento tão grande de ansiedade que até seria compreensível atribuir um possível desmaio a uma sobrecarga emocional e não à falta de virilidade de que muitos fazem alarde, enquanto vivem esta situação do lado de fora.
Os futuros papás, especialmente aqueles que esperam o seu primeiro filho, não compreendem (nem têm de compreender) em que consiste o processo de dilatação e expulsão.
Por isso, se sentem o mais ridículo dos homens quando têm de praticar junto com as suas mulheres os exercícios de respiração que fazem parte do curso de preparação para o parto.
Podem dizer piadas a esse respeito, em parte por ignorância e, além disso, porque sentem um certo desassossego perante a sua sensação de exclusão, com a angústia que isso implica e que eles nem sempre podem expressar, e os demais, muitas vezes, nem conseguem perceber. "Se quem tem de respirar é ela, porque é que eu tenho de fazer o mesmo?".
Assim, surgem as perguntas clássicas quando se aproxima a data: "O que faço quando começar o trabalho de parto e não encontrar o médico ou a parteira?
Posso levá-la para o hospital? E se nasce em casa?
E se desmaio, e em vez de a atender a ela, tem de ser ela a cuidar de mim?"

Eu sei que tens ciúmes...
Outra situação bastante frequente perante a proximidade do parto são as dúvidas que o papá sente a respeito à idoneidade do médico e qualidade da instituição. Mas, como questionar a sua mulher sobre a capacidade daquele ser "fantástico" que tem vindo a acompanhá-la ao longo destes meses tão especiais?
E perante esta incerteza, o que é melhor do que estar ali, controlando? (como se realmente entendesse do que se trata).
Muitas vezes, este é um tema de discussão entre os casais, e alguns pais até chegam a sentir ciúmes perante o que vivem como uma nova exclusão do duo grávida-obstetra. Este temor à capacidade do obstetra será logo transmitido ao neonatologista, e posteriormente ao pediatra.Direito ou dever?

Hoje em dia, estar dentro da sala de partos está na moda.
Os homens cansaram-se de sentir-se excluídos. Por um lado, nenhum homem na realidade, sabe com certeza se esse filho é dele, e tão pouco tem as mesmas sensações que a sua mulher durante a gravidez. Por mais que ponha a mão na barriga e perceba que há algo que se move, em nada se parece com o que sente a mamã.
Não consegue sentir que isso que se move é uma pessoa, e muito menos o seu filho. Na realidade, durante a gravidez, o papá vive a experiência do exterior, como se realmente "o trouxesse a cegonha" ou "saísse magicamente de um broto". Alguns papás desejam genuinamente ser protagonistas, junto das suas mulheres, no momento do nascimento.Mas outros embora não o digam não sentem desejos nem capacidade para fazê-lo.
A sociedade é altamente coerciva com este "dever" ("Como é que não vais assistir ao parto? Não sejas cobarde! Vais deixá-la sozinha?"), mesmo que seja contra a vontade do papá.
No entanto, é fundamental ter em consideração que uma presença imposta pode tornar-se um obstáculo para a parturiente, para a equipa assistente e para ele mesmo.
São poucos os homens que conseguem descriminar que não se é o melhor pai por estar na sala de partos, e podem escapar a essa obrigação e respeitar os próprios desejos e limitações.

De figurantes e protagonistas
Muitas vezes, pode ser a mulher a condicionar tácita e explicitamente o seu marido, sem lhe dar hipótese a dizer que não.
O filho é dos dois, e impossível não estar presente nesse momento tão especial.
Mas também há mamãs que preferem estar sozinhas com a equipa médica e sentem a presença do marido como uma potencial interferência. É ela que o tem de dar à luz, e o homem não tem nada para fazer ali.
Indubitavelmente, a verdadeira protagonista do parto é sempre a mulher. E tão pouco há dúvida de que durante a gravidez é ela a depositária de todos os comentários, mimos e atenções.

A barriga carrega-a ela. Os elogios também.Ela é o centro de atenção e de mimos dos familiares e amigos. E ele? Quem apoia o papá? Quem lhe pergunta como se sente, ou se está cansado? Quando nasce o bebé, enquanto a mamã fica em casa com o seu filhinho, o papá deve voltar a trabalhar 48 horas depois do parto, depois de 9 meses de tensa espera e, talvez, uma noite inteira sem dormir. A ele, ninguém oferece flores nem bombons, e habitualmente tão pouco lhe dão, embora seja numa pequena percentagem, o lugar de "herói" junto da sua mulher. E curiosamente, quase não se vêem fotos de papás a chorar de emoção quando levantam pela primeira vez o seu filho recém-nascido, apesar disso ser algo habitual.Todo o tempo passado...
A puérpera que volta do hospital com o seu bebé nos braços amamenta-o a cada três horas, muda-lhe as fraldas e chora; chora porque chove ou porque faz Sol. Está cansada, e ele não sabe o que fazer. Questiona-se quando voltaremos a ter uma vida sexual como antes? Voltaremos a ser um casal? Às vezes, sofre em silêncio, outras tenta fugir, e algumas respira fundo e "faz de papá", relembrando a época em que vestia o equipamento da sua equipa preferida e ia jogar futebol.

Um direito compartilhado
A mamã que trabalha terá noventa dias para acomodar-se ao período perinatal. O papá não. Apenas pode deitar um olhar ao seu filhinho recém-nascido preso ao peito da mamã e novamente excluído vai trabalhar. Enquanto isso, todo o mundo pretende que volte contente e feliz para se encontrar com uma mulher que já não é a "menina sexy" que escolheu para compartilhar a sua vida, e cujos peitos teme não voltar a contemplar a não ser como um grande biberão com um único destinatário.
Deveriam produzir-se ainda muitas mudanças para que o novo ser que chegou ao mundo se encontre com duas pessoas que tenham as mesmas possibilidades de levantá-lo, cuidá-lo, protegê-lo e compartilhá-lo com mais divertimento do que sofrimento."

in Revista Mãe ideal

4 comentários:

P e M disse...

"Esta realidade foi mudando com o passar dos anos, e de facto hoje são poucos os pais que ficam de fora. Fora da sala de partos e, por fim fora da situação."

Concordo, mas também há aqueles que "ficam de fora" para entrar uma pessoa - a nossa querida Doula ;o) - que nos acompanhará muito melhor... Pelo menos foi esse o acaso! :o)

moya disse...

Lindo artigo! Há aqui coisas em que nunca tinha pensado :)
Quanto à presença da Doula, acho que se é da vontade de ambos os pais é ridículo que em situações normais, não seja permitido aos dois (doula e marido) apoiarem a grávida... Eu sei: pode ser ridículo mas é a realidade... :(

Unknown disse...

pois é... imfelizmente em Portugal as doulas são consideradas acompanhantes... se for um parto hospitalar, ou entra o pai ou a Doula, isto tem de ser alterado com urgencia!
no entanto, acho que os pais sofrem uma grande pressão da sociedade para estarem presentes no parto, e muitas vezes não é isso que realmente querem...e não são menos pais nem companheiros por isso...

P e M disse...

"no entanto, acho que os pais sofrem uma grande pressão da sociedade para estarem presentes no parto, e muitas vezes não é isso que realmente querem...e não são menos pais nem companheiros por isso..."

Exactamente!!! É isso mesmo! ;o)